sexta-feira, 30 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Fogo cerrado na bandeirinha.

Depois que publicamos artigo sobre a bandeira oficial do Município de Itabaiana (PB), muitos internautas têm escrito sobre o tema, a grande maioria para espinafrar nosso símbolo representativo.

Maria do Carmo Arruda sai em defesa da bandeira: “Está no parágrafo segundo do artigo 4º da nossa Lei Orgânica: ‘são símbolos do Município a Bandeira, o Hino e o Brasão, representativos de sua cultura e história’. Não entendo porque as escolas de Itabaiana não levam nosso hino, bandeira e demais símbolos ao conhecimento dos alunos. Não concordo com a opinião de que a bandeira seja complicada e sem sentido. O verde evoca a cor da mais linda bandeira – a bandeira do Brasil; o sol simboliza a hospitalidade do nosso povo. Os outros símbolos são muito claros, dizem respeito aos fatores econômicos e culturais da terra. Os dizeres são incentivos ao nosso povo para que permaneçam unidos num ideal fraterno, trabalhando com harmonia, sendo um exemplo marcante para as futuras gerações”.

Na concepção de José Ricardo Oliveira, que mora no Recife, a bandeira deveria exibir o famoso pé de gameleira estilizado, onde rolava a feira de gado, “com uma coroa no centro simbolizando a Rainha do vale do Paraíba”. Ele acrescentaria um pé de algodão, representando a agricultura, que é de que vive essa terra. Sobre as cores, admite a permanência do verde. Tudo bem, Ricardo, só acho que essa sua ideia fica um tanto retrô, porque a gameleira foi embora na truculência da moto-serra, e o algodão, o bicudo já traçou faz tempo!

João Plácido sugere como símbolo uma caveira de boi, já que em Itabaiana funcionou a maior feira de gado da Paraíba, isso até os anos 1960. Não sei se para os padrões machistas dos itabaianenses ficaria bem uma bandeira com um par de chifres. Em todo caso, é uma ideia...

Fica uma sugestão ao Presidente da Câmara de Vereadores, para que regulamente resolução dispondo sobre a criação de uma nova bandeira para Itabaiana, que a atual, já está provado, não recebe o apoio da grande maioria dos habitantes. A escolha da bandeira seria feita mediante concurso envolvendo especialmente os alunos que estejam cursando o ensino médio nas escolas do Município, estadual ou municipal. Uma comissão julgadora escolheria as quatro melhores ideias, que seriam premiadas com computadores, bicicletas, máquinas fotográficas e MP6.

Fábio Mozart - Sobre o caso da censura

Já sofri restrições no meu direito de expressão antes. No teatro, inclusive. Tive textos censurados pela Polícia Federal e até por um arcebispo. No rádio, fui preso pelo delito de opinião. Isso de restringir a prerrogativa de livre manifestação é comum em países atrasados e primitivos como o Brasil.

Agora, um blogueiro tirou do ar crônica minha onde faço algumas gozações com antigos companheiros de Mari. Um dos citados na crônica ameaçou me processar, e o blogueiro temeu diante da possibilidade de entrar no “bolo”.

Recebi algumas mensagens sobre o caso, que considero menor, “tempestade em copo d’água”, como diz meu companheiro Jota Alves, radialista de Guarabira. Jotinha garante que está solidário comigo, dizendo-se decepcionado com o editor do blog que, segundo ele, “aceitou passivamente retirar a crônica do ar, transformando-se em partícipe da censura”. Diz ainda Jota Alves que o rapaz traumatizado pela crônica deveria escrever um texto contando sua versão sobre as “presepadas”. Jotinha, você aí quer tirar leite de pedra! O rapaz em questão desconhece essas técnicas.

A leitora Ana Maria Gonçalves mandou dizer que eu “deveria me portar de forma íntegra e honesta na blogosfera, pois, ao contrário do que parece, a internet não é brincadeirinha de criança, ela cria e destrói reputações, gravadas para sempre no mundo digital”. Respeito a opinião de Ana, dizendo que já enviei meu pedido de desculpas ao rapaz mencionado na crônica. Se foi citado em uma história ficcional, foi mais como uma homenagem.

Aqui eu sou lido por pessoas sensatas, e confio no discernimento de meu leitor quando se trata de notícias absurdas, quase sempre pouco verossímeis, como a que contei na crônica censurada. Rir de si mesmo é próprio das pessoas equilibradas.

“Não perca tempo com isso”, aconselha o camarada Marcos Veloso. O leitor Abel Gomes lascou essa ironia cheia de finíssimo humor: “veja que na lenda bíblica, Deus preferiu Abel que pastorava ovelhas ao Caim que cultivava a terra, num claro preconceito contra os agricultores, culminando com a CPI do MST. Portanto, a lenda é uma narrativa de matéria supostamente verdadeira. Não se pode distinguir o que é verdade do que é mentira numa lenda. Todos os folclores estão repletos de lendas, e essas pessoas que você citou são figuras folclóricas de sua cidade, portanto...”.

É como diz o meu compadre Benjamim de Campina Grande: “Toca do Leão não é esconderijo, é canto de repouso e fonte de energia-sabedoria”.

quarta-feira, 28 de outubro de 2009

O teatro em Itabaiana e outros fatos históricos.

Este é o título do livro que o Doutor Romualdo Palhano está finalizando, onde relata e reflete suas experiências no Grupo Experimental de Teatro de Itabaiana – GETI – trupe onde o ilustre professor começou sua vivência nas artes cênicas. No final deste ano, ele estará em Itabaiana para pegar depoimentos de antigos companheiros que fizeram parte desse grupo teatral amador para o livro, que será publicado no começo de 2011.

Romualdo pede para que eu escreva o prefácio do seu livro, adiantando que possivelmente em janeiro próximo estará fazendo lançamento da obra "Fronteiras Entre o Palco e a Tela - Teatro na Paraíba - 1900 - 1916", resultado do seu Pós-Doutorado. Nesta obra há um capítulo sobre o "Teatro da União Dramática" do início do século XX que existiu na Rua 13 de Maio. Este teatro pertencia à União de Artistas e Operários de Itabaiana. Foi uma das primeiras experiências dramáticas em nossa terra.

Fico orgulhoso por fazer parte desse projeto literário/histórico do Mestre Romualdo Palhano, que por justiça será reconhecido como Cidadão Itabaianense pela Câmara local pelo seu empenho em divulgar nossa cultura. Somos cúmplices nessa missão de vida, que é de amar essa arte misteriosa e sedutora chamada teatro.

Esse competente professor, hoje na Universidade Federal do Amapá, informa que estará lançando seu segundo livro de poesias intitulado "Entre Parénthesis". É mais um poeta da terra de Zé da Luz, onde as pessoas vivem com o coração aquecido pelo afago lírico. Poeta polivalente que é, Romualdo não deixa por menos e lança seu livro no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar, da Sociedade Amigos da Rainha, possivelmente em dezembro.

Quis o destino que o livro de Romualdo contando a história do Grupo Experimental de Teatro de Itabaiana saísse na época em que nossa trupe volta às atividades. Agora mesmo estamos ensaiando para relançar a peça “ABC de Zé da Luz, o poeta do povão”, de minha autoria, espetáculo cuja estréia se deu no lançamento do livro “O cancioneiro de Zé da Luz”, de Reginaldo Antonio de Oliveira, em 1979.

Louvemos a militância mais que brasileira, itabaianense, do Mestre Romualdo Palhano, um sujeito que cumpre sua missão de espalhar arte/cultura por onde vai, com dignidade e talento. Orgulho de Itabaiana, que deverá reconhecer seu valor.

FOTO: Romualdo atuando na peça "Acalanto de Joana, a louca" - 1989.

Fábio Mozart - Ainda sobre a bandeira de Itabaiana.

Acho que está na hora da Câmara de Vereadores de Itabaiana promover debate sobre mudanças na bandeira do Município, que não vem agradando aos habitantes do lugar. Senão vejamos algumas opiniões de itabaianenses que se distinguem pela experiência e conhecimentos.

O amigo David Andrade Monte vem lá de Tocantins para opinar. Em sua ótica, a bandeira de Itabaiana não tem muito sentido. “Nada contra o verde-branco, mas, está mais para bandeirolas de times; algum ajuste deve ser feito no formato e na disposição das cores, artistas criativos em nossa Itabaiana não faltam; A formatação do que seriam os morros circundantes, à primeira vista, perante um desavisado, demonstraria o desenho de algum animal abatido, ainda que não se identifique a espécie; mais: alguns veriam uma língua sobressaindo em estado terminal, ou seria a entrada de um túnel - mas, que túnel? E as cavidades brancas? Olhos! Janelas! Ou estão alí pra confundir?”

Mais do lúcido estudo de David: “Entre o esboço da linha e o do morro, a imensidão "branca" parece remeter ao leito do rio Paraíba, porém, falta-lhe sentido, em todos os sentidos; O slogam de cunho positivista, normal nas primeiras décadas do século 20, carece de criatividade e senso de modernidade. Resumindo: lancem, com apoio de organismos constituídos, uma campanha pela adoção e/ou mudanças na bandeira, mediante critérios democraticamente pré-estabelecidos, através de uma comissão mista de notáveis e populares, com o estabelecimento de regras claras e diretas, previamente discutidas, tendo no formato final prêmios e reconhecimentos aos melhores criadores.”

Sidney Pereira foi mais enfático na questão política local: “Em primeiro lugar, a frase "unidos e sempre crescendo" é uma piada de mau gosto, pois não condiz com a realidade. Em segundo lugar, colocaram um carro de boi e um trecho de ferrovia, meios de transporte que em Itabaiana não tem uso, o carro de boi faz muito tempo que já foi e o trem não leva mais ninguém (isso dá um mote).
Não sei a data em que foi instituída a bandeira, porém, concordo que há símbolos desconexos e quanto à frase, União em Itabaiana só a UNIÃO DOS ARTISTAS e um time de Futebol UNIÃO, da época em que havia um juiz de futebol chamado Bilisco (fabricante de bolas de couro de futebol) e do Presidente do Time União, quando ainda jogava CORDÃO (João Bernardo). Se houvesse união, Itabaiana não teria estacionado no tempo, com raras exceções!”

De Brasília, Rosário Paiva também opina: “Estou vendo esta bandeira pela primeira vez, na minha lembrança era outra. Ela na verdade não tem conexão entre as imagens. Não dizem muito ou talvez quase nada. Vamos modificar pedindo uma orientação de um historiador. Não sei bem, mas talvez seja o caminho.

A professora Telma Lopes também implica com o emblema da cidade: “Desde o momento que a nossa Escola recebeu essa bandeira, achamos algo estranho a respeito dos seus símbolos. Inclusive não soubemos com clareza explicar ao nosso alunado o que os mesmos significam”. Ela também pede um toque de beleza para a flâmula itabaianense.

FOTO: O itabaianense David do Monte opina sobre a bandeira

segunda-feira, 26 de outubro de 2009

Fábio Mozart - A bandeira mais feia do Brasil

Um amigo itabaianense mandou mensagem provocativa e eu coloco o assunto em pauta no sentido de também forçar uma discussão, sem ofensa e sempre reverenciando nosso símbolo, que é a bandeira de Itabaiana. Não sei quem desenhou a dita cuja nem o que levou esse meu leitor a eleger nosso esverdeado símbolo como o mais feio do Brasil, segundo ele, levando em conta o valor do fenômeno artístico, o uso de frases (o que ele considera abominável) e a disposição dos símbolos. Para ficar como a pior no ranking das bandeiras desse País com mais de 5. 000 municípios é preciso que ele explique melhor suas razões estéticas.

O que acham meus leitores? Um camarada, certamente vascaíno, disse que feia mesmo é a bandeira do Flamengo. Eu já considero que a nossa bandeira da Paraíba, a tal do NEGO, é um prodígio de mal gosto. As duas são rubro-negras, daí... Em um site da internet, a bandeira paraibana obteve o primeiro lugar como a mais feia do Brasil. A mais bonita ficou sendo a do Paraná. Tem até um movimento para mudar a bandeira paraibana, que dizem representar um homem apenas, João Pessoa, e não todo o povo e a História da Paraíba.

Mas voltando à bandeira de Itabaiana, seu lema “unidos e sempre crescendo” é um primor de necedade. Um dos meus leitores sugere que nossa bandeira seja igual à do Paraguai, que tem a única bandeira dupla face do mundo. De um lado, o escudo nacional e a inscrição "República do Paraguai". No verso, o selo do Tesouro e o lema "Paz e Justiça". Conforme a sugestão do leitor, a nossa teria de um lado “a turma do bem”, e do outro lado “a turma do mal”. Quem estivesse no poder seria, momentaneamente, a “turma do bem”. Pode uma tolice dessas?

Os símbolos representam a alma de um povo, o espírito de uma comunidade. Nossa bandeira apresenta uma linha férrea e um carro de boi. Como meio de transporte, estamos mais defasados do que salário de aposentado. O descompasso aumenta com a apresentação de uma montanha e o sol nascendo por trás dessa elevação misteriosa. Que monte seria esse? O alto do Major? Outro leitor sugere trocar o carro de boi pelo bonde, para lembrar que fomos a primeira cidade paraibana a ter bonde puxado a burro. Mas compramos os bondes velhos de Timbaúba, porque nossa rival adquiriu bondes elétricos novos e nos passou a sucata.

Tem muita coisa que não se encaixa na nossa bandeira. Voltarei ao palpitante assunto.

domingo, 25 de outubro de 2009

Fábio Mozart - No dia do meu aniversário

O mundo celebra festivamente o 54º aniversário do velho Fabinho neste 25 de outubro. Sob os rigores dos anos, este cabra ainda persiste no hábito de engolir meropéia, dando-se o direito de levantar um brinde em seu próprio louvor, ato de tamanho cabotinismo, mas, no fundo do copo, cheio de uma “etílica brasilidade”, no dizer do poeta Jessier Quirino.

No meu 54º aniversário, ainda me preocupo pela satisfação dos interesses coletivos, mas como estou perigosamente com o prazo de validade vencido, já dobrando o famoso cabo da boa esperança, permito-me apenas recordar o passado, lastimar as dores da velhice e o empobrecimento ilícito a que sou submetido pelo Governo, algoz dos aposentados. Nos aniversários, é bom a gente fazer assepsia na alma. Nossa parte imortal, para quem acredita, é como os filtros: com o passar dos anos acumula impurezas.

No verdor dos anos, costumava comemorar no prostíbulo (palavra bela!) de Nevinha Pobre (sim, havia uma Nevinha Rica), com um magote de irreverenciosos amigos, na minha Itabaiana querida. A tal Nevinha foi a viga mestra da prostituição na rua do Carretel. Não era apenas uma comerciante carnal que só pensava nos lucros do lenocínio, era uma espécie de mãe e conselheira, amiga de suas meninas, a quem chamava de afilhadas. Para nós, uma mestra dos prazeres, merecedora do respeito e deferência dos rapazes. O romancista português Carlos Oliveira define a prostituta como “um bem coletivo”.

Hoje, fazendo uma retrospectiva da vida, vejo que não posso mudar o que passou, mas posso deixar pra lá. Plantar uma árvore, ter um filho, escrever um livro. Essa, em tese, seria a realização de um homem na sua passagem pela vida. Estou, nesse caso, de curriculum mais do que preenchido, até com um certo exagero. Plantei quase uma floresta em Bananeiras/PB, ao longo do curso de agronomia no Colégio Vidal de Negreiros. Só não replantei a Mata Atlântica inteira porque fui expulso devido a um entrevero com um capitão do Exército, mas isso é outra história. Tive seis filhotes, vingando cinco, e escrevi quatro livretos, sendo que um deles, “História de Itabaiana em Versos”, foi adotado pelas escolas de Itabaiana, o que atesta sua qualidade.

De qualquer forma, conforme a cultura dos números, segundo a qual somente os terminados em zero devem ser comemorados, resolvi não festejar meus 54 anos de vida boa aperreada. No máximo, farei uma festinha simples no interior de mim mesmo.

Prefiro lembrar das coisas divertidas de minha existência, que vou desfiando aqui na Toca do Leão, para o deleitamento dos meus seis ou sete leitores fiéis. Faço minhas as palavras do General Newton Estillac Leal: “Andei em muitas guerras, delas nem sempre trouxe uma vitória, mas de todas trouxe uma anedota”.

Citando ainda o grande Joaquim Nabuco, que em seu diário escreveu: “Sinto-me em ordem de marcha para o desconhecido. Quando se é jovem, os amigos, prolongamentos de nós mesmos, são jovens como nós e têm a vida diante de si. Na mocidade olha-se para diante e não para trás, e os camaradas pisam nos caídos sem o sentir. No declínio, está-se entre os feridos abandonados no campo de batalha, ouvindo os gemidos a que não se pode atender e esperando nossa vez de descansar...”

FOTO: Em 1988, imitando o ídolo Raul Seixas

sábado, 24 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Voltei, Recife

Não foi a saudade que me trouxe pelo braço, conforme o frevo de Luiz Bandeira. Essa incompletude não me corrompe a alma, já que nunca morei lá. Fui visitar o comércio pujante da velha capital pernambucana, que de tão próxima a João Pessoa, depois da duplicação da BR-101 vamos virar subúrbio de luxo da Veneza brasileira. Na qualidade de “estrangeiro” na terra de Joaquim Nabuco, é preciso que eu tenha a sinceridade de afirmar que o caos urbano transformou aquela cidade em um espaço irremediavelmente arruinado. Recife hoje é uma cidade inviável. O quadro de miséria e o estado geral desordenado do trânsito e dos espaços urbanos é excepcional.

No mangue nascem, crescem e servem de alimento os mesmos crustáceos da “Geografia da Fome”, que Josué de Castro tão bem estudou sessenta anos atrás. O ciclo do caranguejo continua, agora sem muito siri, devastado pela poluição dos rios, mangues e mares. A miséria humana é quase a mesma, com exceção do advento de novas chamas infernais que atendem pelo nome de “crack”. A prostituição infantil, a violência sem nenhum controle, a degradação visual e o estado de carência absoluta da maioria de sua imensa população aumentam as negras manchas demográficas, como uma célula cancerígena incontrolável e incessante.

Rodeado por essa nuvem de horror, o Recife permanece lindo, com seus casarões, suas pontes, suas praias, sua cultura sofisticada, seus renascimentos musicais como o movimento “mangue beat”. No meio daquela inferneira, de repente você se depara com o Jardim Botânico, um encontro com a natureza mais bela e sadia, mata, trilhas, fauna e flora nativos de um dos últimos redutos da Mata Atlântica, escondidos no meio da completa desordem do trânsito da BR-232, no Curado.

E sua geografia humana? O recifense é um ser que, vivendo tão perto da Paraíba, tem sotaque diferente do nosso. Eles preservam um certo distanciamento preconceituoso do paraibano, isso é certo. A cidade do frevo, maracatu, coco, ciranda e caboclinho influenciou e muito a minha Itabaiana, que fica na fronteira entre os dois estados. Antigamente, Itabaiana vivia no ritmo do Recife. Torcíamos pelos times de lá, nosso carnaval tinha a marca de Pernambuco. O trem ligava as duas cidades e fazia esta simbiose. Mesmo porque só podíamos sintonizar as rádios Jornal do Comércio e Clube de Pernambuco.

Voltando ao Recife de hoje, passo no Pátio de São Pedro para ver seus museus, memoriais, espaços de pesquisa e preservação desde a arte popular às manifestações culturais mais modernas. Tem até um Memorial Chico Science, líder de um movimento cultural que marcou época nos anos 90 no Recife. Tem a Casa do Carnaval, tradicional ponto de encontro de carnavalescos, um dos mais ricos patrimônios imateriais de Pernambuco. É um território cultural que dá gosto. Esse é o Recife imortal, asfixiado por um sistema urbano quase insustentável. Drama comum de nossas megalópoles do terceiro mundo.

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

NOTA DE ESCLARECIMENTO

Peço aos blogueiros que retirem do ar a crônica AS PRESEPADAS DE FERNANDO RODRIGUES, e publiquem o comunicado abaixo, ficando muito grato pela deferência:

NOTA DE ESCLARECIMENTO
A crônica “As presepadas de Fernando Rodrigues” se trata de um texto ficcional, embora usando nomes de pessoas conhecidas, com quem tenho, ou pensava ter, suficiente intimidade para gracejar, sem que isso viesse a macular a honra e a dignidade de ninguém. Mas, sabedor de que Fernando Rodrigues anda me ameaçando com processo, adianto que não foi minha intenção ferir a dignidade do conhecido radialista, e só me referi a ele porque pensava que o antigo camarada ainda mantinha o espírito de desportividade e bom humor.

Os humoristas do CQC foram processados por racismo. Tom Cavalcanti foi processado por um ex-prefeito de Belo Horizonte. Uma humorista italiana corre o risco de ser processada porque mandou o Papa “pro inferno”. Juliana Paes processou o humorista Simão da Folha de São Paulo. Na época da ditadura, todos os humoristas do jornal O Pasquim foram presos pelos generais.

Para evitar mais mal entendidos, deixo de publicar minhas crônicas no blog do professor Josa, que também foi um dia processado pela delegada de Mari por ter dito em uma entrevista que “a Justiça é lenta”. Eu próprio fui testemunha no caso, já que publiquei a entrevista no jornal O Norte.

O humor não quer ferir ninguém. Todo dia fazem piadas com o Presidente Lula e ele nem liga. Num certo momento do pós-1964, os humoristas foram o grupo que mais incomodou os militares. Meu amigo Assis Firmino tem dito que manda imprimir as matérias onde falo dele e guarda com carinho.

Ao Fernando Rodrigues, minhas desculpas por ter, inadvertidamente, causado constrangimento e mal estar.

Aos leitores do blog, também minhas desculpas e despedidas.
Fábio Mozart

Fábio Mozart - Praça restaurada anima cultura de Itabaiana

Quem chegava a Itabaiana só tinha dois pontos turísticos para visitar: a ponte de Guarita e o alto do major Nonato. Hoje temos a Praça Epitácio Pessoa reformada como um novo centro cultural, um elemento urbanístico dotado de espaços e equipamentos como o teatro de arena e um bar temático em homenagem ao maior nome da música brasileira, o itabaianense Sivuca.

A praça, em design contemporâneo, já é o novo point da cidade, promovendo uma reconfiguração cultural, levando para o âmbito da cena pública manifestações de arte cênica, como as protagonizadas pelo Grupo de Teatro Cena Viva. Na última apresentação na praça, o grupo foi visto por mais de 300 pessoas, trazendo, sem dúvidas, um renascimento do interesse pela arte cênica, e isso é muito salutar para as novas gerações.

Ao promover a cultura e o entretenimento, o teatro de arena da Praça Epitácio Pessoa representa a ideia de um espaço que dialoga com movimentos culturais díspares. Tem espaço para exposição de artes plásticas, área de convivência, piano-bar, teatro de arena, enfim, um lugar que poderá exercer o papel de local para nossos visitantes conhecerem um pouco da movimentação cultural da cidade, suas expressões como os poetas e escritores, grupos teatrais e musicais. Esperamos que um Memorial de Sivuca venha a ser realmente implantado, com exposição de um acervo considerável do mestre.

O fato de termos a Praça Epitácio Pessoa cumprindo essa função de divulgação da nossa cultura vem se juntar à inauguração, no início de novembro, do Ponto de Cultura “Cantiga de Ninar”, uma parceria do Ministério da Cultura com a Sociedade Amigos da Rainha do Vale do Paraíba. Os artistas locais serão prioridade no Ponto. Nosso primeiro passo é instalar um centro de multimídia, com estúdio de gravação de vídeo, ilha de edição e demais equipamentos destinados a documentar as ações do Ponto. A dinâmica será descentralizada, pois buscaremos realizar atividades dentro e fora do espaço físico, na Galeria Lins, no centro da cidade. A praça será palco de muitos eventos do Ponto de Cultura, e no calendário de atividades certamente o teatro terá destaque. Temos o Grupo Experimental de Teatro de Itabaiana, que na inauguração do Ponto de Cultura apresentará cenas da peça “ABC de Zé da Luz, o poeta do povão”. Enfim, esse equipamento quer se tornar referência em pesquisa, memória e formação da cultura itabaianense. Vontade para isso não falta à equipe.

Portanto, nossos votos para que a Praça Epitácio Pessoa se torne um sadio lugar de boemia e encontro das diversas atividades culturais que ocorrem na velha Itabaiana. Para os nossos conterrâneos que moram atualmente em outras cidades, aqui vai essa notícia alvissareira, com a esperança de que a praça e o Ponto de Cultura criem meios para receber um fluxo de visitação turística, fortalecendo a diversidade e valorizando a produção local, conquistando novos públicos e investindo nos estudantes. Nosso propósito é trabalhar diretamente com as escolas públicas do Município, levando os alunos a interagir com os projetos do Ponto, criando novas plateias para o cinema, o teatro, a literatura e outros segmentos, oferecendo espaço para a produção e difusão dos artistas locais.

terça-feira, 20 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Amizade e amor.

Pode ser que um dia nos afastemos...

Mas, se formos amigos de verdade,

a amizade nos reaproximará.

(Albert Einstein)



Tem a amizade e o amor. A amizade é livre e despreocupada. O amor é a “progressiva apropriação indébita do outro”. Sufocante, o amor é possessividade pura. A amizade é compassiva, é democrática, solidária. O amor é uma ilusão perigosa.

O amor é narcisista e excludente. A amizade subsiste sem traumas. Misterioso, o amor exige que se fique sempre à espreita, esperando um bote do tigre do ciúme ou outra facada mortal traiçoeira qualquer, movida pela mão da insanidade. Arnaldo Jabor escreveu que “não somos vítimas do amor, só do sexo”. Nelson Rodrigues sentenciou que “se o amor não for eterno, não era amor”. Discordo. O amor é uma aflição que dura uma eternidade, até que a gente se dá conta de que o amor é uma inutilidade, uma praga que pega e corrompe. A porra do amor exige demais; doação, vontade, energia, dedicação até seu último alento.

A amizade é anarquista! Não sou o tipo de pessoa que tem muitos amigos. Reservado ao extremo, divido a vida em colunas de débito e crédito. Na parte dos débitos, acuso um monte de feridas feitas por pessoas da intimidade. Mas os poucos amigos e amigas que consegui contabilizar ao longo da vida foram meus créditos mais proveitosos.

Nesse ato de autoflagelação que é o amor, às vezes se sai com o couro ardendo e com uma inimizade para sempre. A amizade pode amainar, mas sempre persiste aquele sentimento de serenidade. O amor tem uma tendência à paranóia, a compulsão de estar sempre analisando o outro, buscando significados ocultos em olhares, ausências, detalhes sutis que uma mente embotada por esse vírus transforma em cenas trágicas.

Aristóteles conclui que a amizade, e não a justiça (como sustentou Platão na República, o grande diálogo sobre a justiça), parece ser o laço que une as comunidades. Para Aristóteles, a amizade é mais elevada que a justiça, porque esta já não é necessária entre amigos. Paul Valéry acreditava que todo o homem tem em si um ditador e um anarquista. O anarquista é o que preserva as amizades e evita o ridículo do amor possessivo. Do latim amicus; amigo, que possivelmente se derivou de amore; amar. Portanto, amizade procede da palavra amar, conservando a nobreza de uma relação afetiva e excluindo a obsessão.

domingo, 18 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Jessier Quirino lança Berro Novo, em livro e CD.

O poeta e declamador Jessier Quirino lançou sua mais recente obra, Berro Novo. Foi no 1º de outubro, no Bar Seu Cafofa, na Estrada do Encanamento, no Recife. Nos dias 3 e 4, Quirino lançou o livro na Bienal do Livro de Pernambuco. A editora é a Bagaço, o livro contém a costumeira verve poética e humorística do já consagrado Jessier.

Um tal de Fábio Passadisco esteve no Bar Seu Cafofa, que ficou lotado no show de Jessier. Ele informou que a “bela festa contou com as ‘canjas’ de Chico Pedrosa, Santanna e Josildo Sá, enquanto o mestre Jessier autografava o ‘Berro Novo’”. A Academia Passa Disco da Música Nordestina, uma ONG, foi quem comandou a “noite memorável”.

Assim como Jesier Quirino está de Berro Novo, a cidade de Itabaiana, onde ele reside, estará também de recanto novo para sua cultura, que será o Ponto de Cultura Cantiga de Ninar, a ser inaugurado até o final de outubro. Tudo indica que o poeta fará sua noite de autógrafos por ocasião da inauguração do Ponto, na terra de Zé da Luz.

O mais novo trabalho do artista campinense, o livro e CD "Berro Novo", teve divulgação no programa Voz do Sertão, na Rádio Folha FM do Recife e Rádio Universitária. No programa, ele contou histórias maravilhosas e deixou pra todos os seus fãs um abraço "fofo feito areia de formigueiro". Um grandioso talento da nossa arte nordestina, segundo comentário da apresentadora Roberta Clarissa.

“Poesia dita, escrita e musicada”, e de primeira linha, como tudo o que produz o mestre Jessier.

No dia 17 de outubro (ontem, sábado), Jessier declamou seus “causos” e poesia matuta, conteúdo do “Berro Novo”, show e livro do poeta. Ele fez única apresentação em Maceió, no Centro Cultural e de Exposições de Maceió, em Jaraguá. Os ingressos custaram a bagatela de R$ 70 reais. Pra você ver que Quirino não está pra brincadeira, e hoje é um dos artistas mais bem pagos e reconhecidos do Nordeste. Na platéia, o itabaianense Joacir Avelino, admirador da obra de Jessier, atualmente morando na bela capital de Alagoas.

sábado, 17 de outubro de 2009

Fábio Mozart CENA DE TEATRO NA PERIFERIA

MULHER 1 – (Na parada de ônibus) Fulaninha, tu tá toda jeitosa, toda chique, parece uma madame! Quem tá gastando contigo?

MULHER 2 – Ah, minha filha, melhorei de vida! Depois que fui trabalhar no apartamento de um senhor decente lá no Bessa, tou sendo tratada feito gente. Imagina que o homem cismou de namorar comigo, todo respeitador, nem parece o patrão.

MULHER 1 – Já sei que tu tá dando pro homem. Esse povo tem jeito não!
- Ocultar texto das mensagens anteriores -

MULHER 2 – Ah, minha filha! Respeito é bom e conserva os dentes. Vê como fala com essa nega velha. Se o patrão gostou de mim, é porque sou carinhosa e boa de cama e fogão. E quer saber mais? Ele me trata com todo respeito e consideração. Me levou pro motel, coisa de rico, com uísque e tudo.

MULHER 1 – Me conta, mulher! Como foi o sarrabulhado?

MULHER 2 – Ele me tratou bem, mandou eu pegar no pênis dele...

MULHER 1 – Pênis? Que diabo é isso?

MULHER 2 – Oh, mulher ignorante! Não sabe o que é pênis não? É a mesma coisa que caralho, só que mais molinho e mais branquinho...

Cena da peça “Pintou sujeira no Cuiá”, pelo Grupo Massangana de Teatro Popular, inserida no documentário “Feminino Plural”, que conta a participação das mulheres nas rádios comunitárias na grande João Pessoa, e as questões de gênero no movimento de radcom.
O documentário tem formato de vídeo digital, direção de Jacinto Moreno com roteiro de Fábio Mozart.



SE LIGA, MEU IRMÃO!

Tema da peça “Pintou sujeira no Cuiá”, de Fábio Mozart:

Qualquer dia essa galera
Que anda nos descaminhos
Nesses becos e vielas
Procurando seu destino
Na mão do xerife mal
Vai encontrar sua voz
Para dar o seu recado
E ser visto e respeitado
Como uma coisa normal.
Então detonou geral
A transmissão da galera
Passando o comunicado
Que nossa gente queria
Um país em harmonia
Com seu povo alimentado
É um sonho acalentado
Pelos becos e vielas
Nos mocambos das favelas
No “apertado da hora”
Vamos gente, sem demora!
Exigir nossa presença
Comunicando à imprensa
Que a galera tem voz
Eu falando e, cá pra nós,
O povo entendendo tudo
Mesmo de forma precária
Na rádio comunitária
Transmite cidadania
Martelando noite e dia O recado curto e grosso
E acredite seu moço
Que vai chegar esse dia.

Foto: Grupo Massangana em cena.

sexta-feira, 16 de outubro de 2009

FÁBIO MOZART - Botando a mãe no meio

Por causa de um desvio mental, sou um camarada que coleciono poesia ruim. Organizo uma belíssima coletânea de poemas mais do que medíocres. Como especialista nessa parte da literatura de detritos, há muito venho me debruçando (essa expressão é de lascar!) sobre a obra do poeta Caixa D’água, tido como avançado surrealista paraibano que heroicamente publicava versos e vendia aos incautos no Ponto Cem Réis, em João Pessoa.

Manoel Caixa D’água acreditava ser um intelectual, e muitos pseudo-intelectuais admitiam a qualidade dos versos dele. “Caminho perdido” é o mais famoso poema de Caixa, que até hoje os estudiosos procuram entender sua profundidade. Eis a obra-prima:

"Se as noites envelhecessem,
se os meus olhos cegassem,
se os fantasmas dançassem (Não são os fantasmas?)
em blocos de neve
para que me ensinassem
o caminho por onde eu caminhei.
A cidade sem porta,
as ruas brancas de minha infância
que não voltam mais.
Se minha mãe se abruma,
se o mar geme,
se os mortos não voltam mais,
se as matas silenciosas
não recebem visitas,
se as folhas caem,
se os navios param,
se o vento norte
apagou a lanterna,
eu tinha nas minhas mãos somente sonhos.
Eu tinha nas minhas mãos somente sonhos!"

Em uma entrevista regada a “São Paulo” com caju, o repórter perguntou o que diabo significava a expressão “se minha mãe se abruma”. Resposta de Caixa D’água:

─ Camarada, isso é negócio de mãe mesmo! O importante é que só eu, José Américo de Almeida e Renato Ribeiro Coutinho andamos de paletó branco em João Pessoa. Com uma ressalva: Renato é só industrial, e eu e José Américo somos intelectuais.

Só que Caixa D’água não foi o único fenômeno da renovação da poesia a falar da mãe. De lascar mesmo foi o poeta Erinaldo F. de Melo, que escancaradamente botou a mãe no meio e quase botou no meio da mãe. Seu poema “A periquita de mamãe” é um clássico do poema-libido incestuoso. Vejam se não é o fim do mundo:
Bela, bela,
Mais bela que Diadorim
Em plumas descoloridas
Arrepia a lasca da passarinha
Entrância de pêlos, finura de fibras
A periquita concha conchita de mamãe
De jasmins, angélicas, crisântemos
Extasia!

Luiz Silva Filho escreveu um livreto por nome “Poemas crucificados”, onde se afirma negro, poeta, teatrólogo, autodidata, filho de camponês e nascido em Alagoa Nova. Nosso poeta escreveu:

Se eu escrevesse rimando
Eu seria um bom poeta
Mas como estou caminhando
Tento ser a coisa certa.

Os velhos nossos avós
Felizes e brincalhões
O que havia de melhor
Nossas mães valem milhões.

Nem só de mãe, entretanto, vive a poesia sem valor. Lenival Nunes de Andrade agradece à sua professora Irene Gomes, que lhe deu a ideia de escrever:

Eu tive amores com facilidade
Mas eu perdi na mesma velocidade
Me bate uma saudade
Por onde ando na cidade

Já não tenho mais idade
Mais tenho capacidade
Perdi minha mocidade
Implicando nessa vaidade

Pagarei minha anuidade
Ó Deus de bondade
Me faça essa caridade
A minha nacionalidade
Tenho necessidade
Senhor tende piedade
Pois tive amores com facilidade
Mas os perdi na mesma velocidade.

É muito bom um amor
Quando se é correspondido
Se você não é comprometido
Quanto é bom um amor.
Senhor, tende piedade!

quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Associação diz que maioria das rádios comunitárias não atende à população.

Apenas a minoria das mais de 3,8 mil rádios comunitárias autorizadas a funcionar no país atendem aos princípios legais que regem o serviço de radiodifusão comunitária. A afirmação é do coordenador de Comunicação da Associação Brasileira de Radiodifusão Comunitária (Abraço), Josué Franco Lopes.

“A Abraço considera que não chega a 1,5 mil as que são verdadeiramente rádios comunitárias. Das autorizadas a funcionar, a grande maioria é ligada a igrejas, políticos ou a alguma picaretagem”, diz Lopes, para quem isso se deve à inexistência de um órgão que controle o setor com a participação da sociedade civil.

Segundo a Abraço, enquanto processos de associações e fundações legitimamente comunitárias levam anos tramitando no Ministério das Comunicações, processos de rádios ligadas a lideranças políticas ou a grupos econômicos são julgados com maior rapidez.

“É papel do governo federal informar a sociedade sobre o papel das rádios comunitárias, que pertencem à comunidade, que tem de conhecê-la, saber seus objetivos, para poder se apropriar dela”, defende Lopes.

De acordo com o Decreto 2.615, de 1988, apenas associações e fundações comunitárias sem fins lucrativos podem colocar uma rádio comunitária no ar. A emissora, por sua vez, deve ter uma programação pluralista, priorizando a divulgação da cultura da comunidade. Além disso, deve prestar serviços de utilidade pública, oferecendo mecanismos à formação e à integração da comunidade, estimulando o lazer, a cultura e o convívio social.
O decreto proíbe o proselitismo de qualquer natureza (político, religioso etc.) e estabelece que qualquer cidadão da comunidade em que a rádio opera tem o direito de emitir opiniões sobre assuntos abordados na programação da emissora, bem como de manifestar ideias, propostas, sugestões, reclamações ou reivindicações, bastando para isso pedir antecipadamente à direção da rádio comunitária.

Para João Carlos Santim, da Rádio Ascucca de Campos Novos (SC), o desconhecimento sobre os propósitos das rádios comunitárias contribuiu para sua criminalização. “As rádios comunitárias são importantíssimas porque têm uma outra visão do que é comunicação. Acho que o que caracterizou a resistência às rádios comunitárias foi essa campanha das rádios comerciais querendo nos criminalizar.”
Fonte: Paraíba.com

FOTO: Rádio "comunitária" de Mogeiro

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Salve o músico popular!

Conversando com meu compadre Wellington Costa, exímio violonista de Cabedelo, fiquei sabendo que seu pai, o mestre Wilson do Bandolim, conheceu e foi parceiro do cavaquinista itabaianense Artur Fumaça. Esse artista popular é da geração do meu pai, Arnaud Costa. Autodidata, Artur Fumaça aprendeu a tocar bandolim de ouvido e em seguida violão. Especializou-se como animador dos cabarés da rua das Flores e Treze de Maio, famosos lupanares de Itabaiana. Depois partiu para fazer a vida artística nos cabarés de Cabedelo, para gáudio dos marujos estrangeiros que ali aportavam.
Wilson do Bandolim é um admirador eterno do Artur Fumaça. Tocaram juntos em muitas noites de boemia, com outros papas da música popular paraibana, a exemplo do Canhoto da Paraíba, emparelhado com os maiores violonistas que já nasceram no solo pátrio. “Ninguém que toca violão tocaria do mesmo jeito depois de ouvir Canhoto da Paraíba”, garante Wilson. Canhoto morreu recentemente, e Artur Fumaça há muito foi embora. Ele é da terra de Sivuca e de Biu da Rebeca, dois artistas populares inigualáveis. Um, o mestre Sivuca, calhou de levar seu acordeom ao mundo todo e granjear fama e prestígio. O outro, igual a Artur Fumaça, vive apenas na lembrança dos amigos que ainda moram nesse vale de lágrimas, e que tiveram a sorte de ouvir e ver suas performances.

Wilson do Bandolim é solista do grupo de choro “Os Prateados”, de Cabedelo. Fundou a orquestra de violões, é mestre da parte musical das famosas barcas, a brincadeira da “nau catarineta” de Cabedelo, um patrimônio vivo da cultura local. Graças à lei de incentivo a projetos culturais em Cabedelo (Lei Cônego Alfredo Barbosa), foi aprovada produção de DVD dos “Prateados”, onde se faz uma homenagem ao mestre Artur Fumaça. Na qualidade de membro do Conselho Municipal de Cultura de Itabaiana, levarei a idéia de se promover um lançamento do DVD na terra de Sivuca, até como uma homenagem ao Artur Fumaça.

Artur Fumaça é um exemplo vivo de uma geração que dignificou o seu tempo. Nomes como o dele, dos poetas Zuza Ferreira e Bastos de Andrade (irmão de Zé da Luz), Chico do Doce, que foi mestre no teatro popular de bonecos, o nosso babau, entre tantos outros que deixaram a semente de sua criação e talento, com a força da genuína e singular representação da arte que nasce do povo simples.

No documentário, mestre Wilson faz ressoar as cordas do seu bandolim em choros e sambas antigos, com a marca indelével da sua inspiração e como significativa homenagem a Artur Fumaça e tantos outros artistas geniais do povo, que passaram de forma anônima. Garantindo-se no bandolim, violão-tenor, banjo e cavaquinho, mestre Wilson apresenta sua turma, velhos músicos que agora têm gravadas na memória pública e oficial suas performances em choros, valsas, boleros e polcas, numa homenagem mais do que justa e merecida.

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

Fábio Mozart = ENGENHEIRO DESTRUIU PARTE DA HISTÓRIA DE SAPÉ.

Nem tanto pela importância arquitetônica, mas sim pelo seu valor sentimental e histórico, não se justifica a demolição das velhas estações de trem, berços de cidades como Sapé, Mari, Guarabira e tantas outras na Paraíba e, de resto, no Nordeste, onde o trem foi a alavanca do progresso no começo do século passado. Permitir-se que o tempo apague o que de alguma forma marcou a história e o desenvolvimento de uma cidade como Sapé, por exemplo, só pode sair tal idéia da cabeça de pessoas sem nenhuma consciência histórica nem respeito pela comunidade.
Foi no começo dos anos setenta que um engenheiro da antiga Rede Ferroviária Federal de nome Edmur Roque de Arruda resolveu demolir a estação de Sapé. O prefeito José Feliciano não se importou em autorizar a barbárie, permitindo botar abaixo aquele prédio de valor patrimonial-histórico inestimável. Hoje, a velha estação ferroviária de Sapé vive apenas na memória dos mais antigos moradores do lugar, ou nos registros fotográficos raríssimos, como a foto que publicamos no blog.
Na época, não sei se vozes discordantes lutaram para manter pelo menos a fachada do edifício, causando algum entrave à decisão irracional do engenheiro e do prefeito. Isso é de se pesquisar nos jornais daqueles tempos. A demolição deu lugar a um pátio onde foi construído quiosque para reunir a juventude em torno de bebida alcoólica e música de péssima qualidade. Nada de um projeto cultural que, pelo menos, amenizasse a destruição do prédio histórico. Na cidade de Mari, fui o último chefe da estação antes da privatização da Rede Ferroviária e consequente desativação do trecho Paraíba/Rio Grande do Norte. O estilo ditatorial do engenheiro Edmur já não pontificava na empresa. Aposentado, ele não conseguiu terminar a “obra” de demolir as outras estações do trecho. Lutei muito para que a estação de Mari fosse preservada. Por falta de políticas públicas de cultura, a ONG Sociedade Cultural Poeta Zé da Luz assumiu o prédio, onde funciona uma biblioteca e uma rádio comunitária. Em vez de destruir o passado, a própria sociedade mariense cumpriu a função de dar respostas a esse problema, restaurando a dignidade do seu edifício histórico, marco da colonização do Município.

Portanto, no placar da eterna rivalidade entre Mari e Sapé, marcamos esse tento. Sapé condenou sua velha estação, reduzindo-a em um monte de entulhos, sem manifestações em contrário de pessoas e instituições. Aqui, dissemos não à demolição de nossa história, recuperando nossa estação e dando dignidade ao prédio com um projeto cultural tão útil à sociedade mariense.

Vale refletir sobre uma política de reabilitação e restauração das nossas estações ferroviárias que ainda se mantêm em pé, como no sítio Entroncamento, município de Espírito Santo. Em Itabaiana, nossa velha estação foi descaracterizada e vendida a particulares. É chover no molhado ressaltar a importância histórica daquele edifício para o município, uma referência em nossa cidade. Recentemente, soube que a Prefeitura está cuidando de tombar o prédio onde funciona a Maçonaria para abrigar um museu ou memorial de Sivuca. Boa iniciativa. O edifício serviu a uma escola que marcou época nos anos 20, onde estudou José Lins do Rego. Sua arquitetura demonstra o sentimento de grandeza e fausto de nossa elite naqueles recuados anos.

domingo, 11 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Riacho (en)cantado

Geraldo Brindeiro é assessor do deputado Luiz Couto. Em toda reunião aonde vai, ele canta o xote “Riacho do Navio”, música de Zé Dantas e Luiz Gonzaga que fez muito sucesso nos anos 50. Muita gente fica olhando fixo nos olhos de Geraldo para ver se o constrange, mas ele nem liga, porque na sua consciência de classe vai buscar na singeleza dos versos da canção popular nordestina a esperança de transformar esse País em um lugar decente para um povo tão digno, apesar de sua elite dirigente indecorosa.

O gentil Brindeiro distorce a letra da canção do velho Lula Gonzaga só para dar uma força ao movimento de rádios comunitárias:

Pra ver o meu brejinho
Fazer umas caçadas
Ver as pegas de boi
Andar nas vaquejadas
Dormir ao som do chocalho
E acordar com a passarada
Sem rádio, sem notícia da rádio comunitária.

No mesmo ritmo do xote, meu considerado professor Benjamim, itabaianense ilustre que mora em Campina Grande, também bota o povo pra cantar e dançar, iluminando o que merece aparecer para a juventude a quem instrui com sapiência. Foi numa aula sobre nossa origem negra, a opulência da cultura africana que nos foi legada pelos escravos, tudo desaguando no grande rio do conhecimento e costumes brasileiros. Comentando sobre os notáveis músicos negros, os alunos foram citando desde Jackson do Pandeiro a Martinho da Vila, de Pixinguinha a Cartola, da genialidade de um Luiz Gonzaga ao lirismo desconcertante de Djavan, do samba autêntico de Paulinho da Viola ao molejo de Dorival Caymmi, referindo-se ainda a João do Vale, Lupicínio Rodrigues e tantos outros.

Para ilustrar a aula, o mestre original convidou os alunos a cantar uma música de um autor citado.

─ Ganha dois pontos quem cantar aqui, na frente.

Depoimento do próprio Benjamim, mestre na Universidade Estadual da Paraíba: “Um aluno e duas alunas se apresentam. Cantam, se encantam e, no meio da música, o rapaz tira uma colega para dançar. A turma alegra-se. O professor se empolga, faz do birô uma zabumba. Haja xote! Encerrada a música-dança, a aula volta ao normal. O clima é pra cima. Há entusiasmo”.

Foi criada a aula-dança. O professor se pergunta: “há significado pedagógico neste ato?” O trabalho pedagógico requer a oferta de estímulos externos, já dizem os estudiosos da ciência da educação. No circo armado na sala de aula, diferente do que embrutece e hipnotiza, “há congraçamento e amizade no ato de aprender”. A preleção lúdica do professor Benjamim, substituindo a análise fria pelo júbilo e prazer da dança e da música, lembra meu eterno professor Idalmo da Silva nos anos 70 em Itabaiana, saindo da sala de aula diretamente para o boteco para continuar suas palestras didáticas sobre política, sexualidade, literatura etc. Ousadia que lhe valeu a expulsão do Ginásio Estadual.

Um dia, Idalmo achou de cantar uma modinha antiga para explicar um conteúdo. A diretora foi até a sala:
─ Está dando aula? O que está havendo aqui?
Como se o que o professor estava fazendo não fosse aula. Ainda bem que temos professores não acomodados como Benjamim, dando seu show de educador, em atitudes restauradoras, longe do quadro-negro e da mediocridade.

sábado, 10 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Jornal de estudante

Entrei no Colégio Estadual de Itabaiana por via do concurso de admissão. Naquela época, o tal concurso correspondia a um verdadeiro vestibular, dando acesso ao curso médio. Um tempo em que as pessoas liam, estudavam. Ainda quase menino, por exemplo, meu compadre Geraldo Xavier foi ser alfabetizador de adultos na Cruzada ABC que antecedeu o Mobral. Formou uma escolinha e batizou-a de Zé da Luz.

Geraldo Xavier foi redator de um jornal escolar no antigo Ginásio Estadual de Itabaiana. A equipe contava ainda com Fernando Almeida, filho do ex-prefeito Alceu, e Mércia, sobrinha do mestre Sivuca. Após três números, “O Estudante” parou de circular.

Eu também fiz parte de experiências jornalísticas naquela escola. Publicávamos um jornal chamado “O Gaiato”, com a seguinte equipe: Biu Bicudinho, distribuidor; Pedro Lourenço, repórter; eu redator e Djanete Menezes na linha de frente da segurança. Isto porque Djanete já demonstrava seu talento para as artes marciais, forte como uma heroína de estórias em quadrinho, valente e destemida. Era nossa fortaleza para desestimular os que se sentiam ofendidos pelas gaiatices do jornal a apelar para o desforço pessoal.

O jornal rodava-se no mimeógrafo do Colégio, na época dirigido por Fernando Melo. Nosso diretor foi líder estudantil no mesmo colégio, mostrando-se sempre condescendente com as aventuras jornalísticas do pessoal de “O Gaiato”. Para evitar maiores críticas à direção, Fernando gostava de agradar aos “jornalistas”. Abriu conta na barraca de Zequinha para a equipe tomar suas cachacinhas nas horas vagas. Eu, Djanete e Pedro Lourenço tomamos tanto uísque na conta de Fernando que acabamos perdendo o crédito.

─ Pode meter o pau, mas bebida não pago mais! – decidiu Fernando.
Isso foi antes da redemocratização do País, quando a repressão ainda era intensa. A verdade seja dita sobre Fernando Melo: sempre foi um democrata. Segurou a barra de muito estudante denunciado por supostos atos de subversão. Diferente do Dr. Almeida, misto de diretor e promotor público que vivia fazendo relatórios de alunos acusados de “indisciplina”, “desobediência” e “má conduta”. Escolhia alguns para punir de forma exemplar. Muitos foram jogados às feras da ditadura, a exemplo de Lenildo Correia.

Depois, Fernando Melo elegeu-se deputado estadual, Biu Bicudinho morreu, Djanete virou campeã de judô, Pedro Lourenço continuou a carreira de pinguço e eu nem terminei o ensino médio, porque fui trabalhar na estrada de ferro para dar de comer aos filhos nascidos antes do tempo apropriado. É a vida...

FOTO: Fernando Melo sendo entrevistado por Marcos Veloso

sexta-feira, 9 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Porque não leem nossos escritores.

O professor Damião Ramos enviou mensagem perguntando sobre o jornal Tribuna do Vale, periódico de Itabaiana e cidades vizinhas no vale do Paraíba, fora de circulação há mais de seis meses. Na qualidade de redator, repórter, diagramador e gazeteiro daquele jornal, tenho o desprazer de informar que a publicação encontra-se em fase terminal. Fomos vencidos pela tal crise econômica. Com a queda dos contratos publicitários e base de assinantes, fomos à lona. Mas a Tribuna não está só no desastre: nos Estados Unidos já fecharam mais de cem jornais. Publicações de referência na Europa como El País, na Espanha, Le Monde na França e The Times no Reino Unido, além do Corriere de La Será, na Itália, estão com a corda no pescoço. Estamos em boa companhia no fundo do poço. É o começo do fim da imprensa escrita. A internet é a mídia do futuro.

Mas o que quero falar mesmo é sobre a crise cultural que assola nossa terra. Temos ótimos escritores, a começar pelo próprio Damião Cavalcanti, autor de um livro chamado “Ausência do Tempo”, cujos poemas “são talhados para durar”, conforme o grande cronista e poeta Luiz Augusto Crispim, já no andar de cima. De poetas, posso falar de dezenas, dos bons, a exemplo desse menino Ricardo Aguiar, filho do nosso estimado amigo Geraldo Aguiar, Jessier Quirino que dispensa comentários, o também regionalista Antonio Costta e tantos mais. Cronistas do quilate de Reginaldo Alves e Marcos William, teatrólogos da excelência de um Romualdo Palhano, memorialistas do jaez de Arnaud Costa, enfim, ótimos autores itabaianenses que quase ninguém lê.

É que o brasileiro não pode ler. Além da falta de grana, segundo a Unesco, 20 milhões de brasileiros com mais de 14 anos são analfabetos; 50 milhões de adultos não passaram da primeira série do primeiro grau e são, portanto, analfabetos virtuais. Esses números posicionam o Brasil entre os três países com o pior nível de ensino do mundo. Para os poucos que gostam de ler, não existe programa de incentivo à leitura. Portanto, o produto cultural dos nossos escritores não circula. Por isso é que a leitura é um privilégio e não um direito nesse País.

Pensando nisso, o vereador José Assis Almeida, o Zé Cobal, apresenta projeto de lei incluído na grade curricular do ensino fundamental da Rede Municipal de Itabaiana, o cordel intitulado História de Itabaiana em Versos, de minha autoria.

Na justificativa, o vereador alega que “a adoção desta obra na grade curricular, pela Rede municipal de ensino, muito contribuirá para que os jovens estudantes itabaianenses conheçam de forma lúdica e poética a história e a formação de nossa cidade, através dos versos cordelescos que, obedecendo a uma cronologia histórica perfeita, traça toda uma trajetória da ‘Rainha do Vale’, que enche de orgulho o coração de todos os seus filhos”.
De minha parte, manifesto minha gratidão ao amigo Zé, comprometendo-me a inaugurar uma biblioteca no Ponto de Cultura Cantiga de Ninar, onde nossos autores estarão ao alcance da população itabaianense.

FOTO: Damião Ramos é diretor do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico da Paraíba

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Assis Firmino, o folclorista folclórico

Em Mari se costuma dizer que Assis Firmino é como bolacha: em todo canto se acha. Esse camarada tem como regra de vida se meter em tudo que diga respeito à sua comunidade, tudo mesmo! Na religião, no esporte, na política, na cultura, no folclore. Enfim, um cidadão participante. Dizem as más línguas que ele é mesmo um fofoqueiro de primeira, mas fofocar é saudável. Papear sobre a vida alheia faz bem à saúde, é relaxante, melhora o humor e a pele.

Assis Firmino é um caso típico de alguém que veio de baixo e conseguiu o famoso lugar ao sol. Para ficar nos adágios populares, “quem não tem vergonha, todo o mundo é seu”. Assis era gari da Prefeitura, semi-analfabeto, mas inteligente e desprovido de qualquer tipo de timidez. Como um sujeito insinuante e bom de lábia, foi promovido a chefe dos garis, e depois conseguiu ficar em disponibilidade, para assuntos extraordinários ligados à comunicação, já que nosso herói tomou gosto pela locução ao usar pela primeira vez o microfone do alto-falante do Sindicato dos Trabalhadores Rurais. Gostou tanto da função que nunca mais parou. Dizem que ele sofre de “microfonite aguda”, um tipo de doença que faz com que o paciente não possa ver um microfone: quer logo falar no dito cujo.

Assis é um crioulo baixinho e gordinho, gente fina, pachorrento e bon vivant. “Só trabalha quem não sabe fazer outra coisa”, diz o ditado. Pois “quem procura sempre acha, senão um prego uma tacha”, Firmino foi galgando as posições. Secretário do sindicato rural, diretor de associação de moradores, assessor de comunicação da Prefeitura, animador cultural e mais um bocado de coisas. “Quem não aparece, esquece; mas quem muito aparece, tanto lembra que aborrece”. Assim a figura de Assis Firmino criou as facções contrárias e favoráveis. Uns o consideram um chato e intrometido, outros o acham engraçado, folclórico, cordial, participante, lutador pela cultura popular, pelo futebol e amante de sua terra e sua gente. Já foi palhaço de pastoril, diretor de time de futebol, empresário de cantador de viola e apresentador de programa de rádio. Nisso passou de proletário para arremediado, porque “quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é tolo ou não conhece da arte”. Mas “quem vai à guerra dá e leva”, portanto nosso Assis Firmino não é muito querido nas hostes da oposição, já que ele é adepto do ditado que diz: “mais vale ser rabo de tubarão do que cabeça de sardinha”. Resumindo: ele sempre está ao lado de quem está no poder, porque “não se malha em ferro frio” e “onde o galo canta, lá mesmo almoça e janta”.

O comunicador Assis Firmino às vezes confirma e às vezes desmente os provérbios: “quem muito fala, pouco acerta”, ou “quem diz as verdades, perde as amizades”, ainda “a palavra é de prata e o silêncio é de ouro”. Vai falando porque “cada qual é para o que nasce” e cada um ao seu modo. Desconfie do homem que não fala e do cachorro que não late, e difícil é agradar a gregos e troianos. E ele tem alguns inimigos históricos! Um rapaz que se acha muito superior, dono de uma rádio “comunitária”, tem mesmo ódio de Assis Firmino. Já protagonizaram brigas homéricas nos tribunais. Os dois disputam para saber quem é o mais sabido, já que “passarinho que anda com morcego acaba dormindo de cabeça pra baixo”. Mas quem tem telhado de vidro não joga pedra no vizinho, e “focinho de porco não é tomada”, Firmino segue sua vida pelo mundo da comunicação e afins. Brigar com Assis Firmino é puro desperdício, que ele não leva nada a sério, não guarda mágoas e é capaz de confraternizar com seu pior inimigo.

Nesse embalo, vai levando “na valsa” seu estilo de vida. Admirador da poesia popular, tem no mestre Manoel Xudu seu grande ídolo. Em homenagem ao vate, fundou a Associação Cultural Poeta Manoel Xudu. Em crônica que escrevi em 1993, afirmei que certo dia, na fazenda Taumatá, Antonio Julião encontrou-se com Zé Xavier e pediu um mote:

"Viola, se tu falasses,

Dirias quem foi Xudu...”


Dizem que Zé Xavier fez versos tão bonitos que Assis Firmino pegou a chorar no ombro de Julião...

FOTO - Governador Zé Maranhão faz "trenzinho" com Luiza, a ave de rapina de Sapé, e Assis, o "mala" de Mari.

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

FÁBIO MOZART - Idalmo da Silva, o cangaceiro do bem, no pinga-fogo do Ponto Cem Réis.

Esse cangaceiro com ar feroz chama-se Idalmo da Silva, uma criatura que tem solidariedade nas veias. Formado em Direito e sem jamais praticar um ato de bacharelice, Idalmo ingressou no Magistério estadual, de onde foi muitas vezes ameaçado de expulsão por ensinar aos seus alunos que existia vida além dos compêndios escolares. Com seus esbugalhados olhos de pitomba e sua fé no homem, foi o primeiro candidato a senador pelo Partido dos Trabalhadores na Paraíba e o primeiro ator a encarnar a personagem Lampião em minha peça “A Peleja de Lampião com o Capeta”, em 1976.

Idalmo tinha 15 anos e só vivia trancado no quarto, lendo velhos livros de filosofia, no bairro de Jaguaribe. O pai dele, preocupado com o isolamento do rapaz, convidou-o certo dia de 1958, para ver um espetáculo musical em praça pública no Ponto Cem Réis com a cantora Ângela Maria, o maior sucesso do rádio na época. Depois de muita insistência do velho, Idalmo foi ver a cantora e se encantou de tal forma com o largo que nunca mais saiu de lá. Passou a fazer parte da paisagem humana do Ponto Cem Réis. Por isso, João Pessoa sem Idalmo é coisa incompleta.

Nathanael Alves escreveu que o Ponto Cem Réis é o ponto de referência de vidas provincianas “que continuam solidárias porque se abraçam e trocam afetos de mão”. O jornalista Benedito Maia escreveu um livro sobre o Ponto Cem Réis, considerando aquele recanto de João Pessoa como uma universidade e seus vários departamentos; Recursos Humanos no Café São Braz, Relações Públicas no Cabo Branco, Anestesia no Bar do Miruca e Gabinete do Reitor no calçadão da Duque de Caxias. Essas referências hoje não existem mais. Desapareceram também o Café Alvear, a sorveteria Canadá, a fonte luminosa, o pavilhão dos engraxates e, principalmente, figuras humanas do tope de Alarico Correia Neto, Teócrito Leal, Evandro Nóbrega, Mário Santa Cruz, Raimundo Onofre, Clodomiro Paz, Mocidade, Mário da Gama e Melo, Plínio Lemos, Edísio Souto, Gilvan de Brito, Ramalho Leite e muitos outros. Uns foram para o andar de cima e outros desviados pela vida para outros cenários.

O jornalista João da Veiga Cabral, declarou que aquele era “o centro cardíaco da cidade”. Numa reportagem, ele provou que era possível o sujeito nascer, viver e morrer sem nunca sair do Ponto Cem Réis. Não é o caso de Idalmo, que nasceu em Jaguaribe mas garantiu sua humanidade e seu relacionamento com o mundo na pulsação e vibração das rodas de boatos daquele centro, onde “se pode trabalhar e destrabalhar” na imensa vida social pulsante do largo, objeto de tantas intervenções da Prefeitura, mas que continua com seu espírito. Muda-se a paisagem, permanece a alma do Ponto Cem Réis.

Idalmo da Silva ainda faz ponto no Ponto Cem Réis. Meio desgarrado, um tanto perdido, de vez em quando recebe visita de Tenente da Gelada com sua loucura lúcida, acompanhado do “poeta” Caixa D’água. Vêm seguidos por Alegria e Mocidade, um levando a alma do circo e o outro declamando discursos cívicos. Virgínius da Gama e Melo também ronda a praça, batendo altos papos literários com Edson Ramalho, Petrônio Figueiredo, Flóscolo da Nóbrega, Geraldo Porto, Major Ciraulo e Botto de Menezes, ao som carnavalesco de Livardo Alves. A nova paisagem do Ponto de Cem Réis não lhe tirou o lirismo.
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terça-feira, 6 de outubro de 2009

FÁBIO MOZART / Um herói de Itabaiana

“Quem faz o que gosta não precisa trabalhar”, sentencia a sabedoria do povo. Diz que os empresários já perceberam que os melhores empregados são os que trabalham como os artistas, gente que se entrega às suas tarefas com prazer e dedicação integral. É o que se chama de vocação.

O assunto me vem à baila quando leio na imprensa escrita que um soldado da Polícia Militar, do destacamento de Malta, inventou um método que utiliza imagens de satélite para realizar ações de combate ao tráfico de drogas na região. O policial Messias Paulino, idealizador do sistema, disse que já foram desarticulados dois pontos de venda de crack e maconha e que outros estão sendo monitorados para as próximas investidas.

No domingo, a imprensa noticia que uma dupla de bandidos sequestrou um ônibus que vinha de Bayeux para João Pessoa, “por pouco não servindo de palco para uma tragédia idêntica à que ocorreu no Rio de Janeiro, quando uma passageira feita refém dos assaltantes foi morta no conflito com a Polícia”, conforme esclarece o texto do jornalista Humberto Lira. Depois de mais de uma hora de negociações, os sequestradores se entregaram. O negociador foi o Aspirante Carlos Eduardo, oficial do CHOQUE, tropa especial da PM que cercou o ônibus. Ele poderia ter atirado nos rapazes, teve chance para isso, mas preferiu o caminho do diálogo a correr o risco de vitimar inocentes, no caso, os passageiros e tripulação do ônibus.

Esse verdadeiro herói urbano arrisca sua vida para defender a sociedade, em troca de um salário ridículo. Ele e tantos outros fazem mais do que pede sua profissão, dedicam-se de corpo e alma ao seu ofício, e merecem o nosso reconhecimento. Depois do caso sucedido, não ouvi nenhum político comentando e nenhum comandante exaltando a ação do policial Carlos Eduardo. A igreja não permite o controle da natalidade, a família e o Estado não oferecem educação, o País não dá emprego e querem que a Polícia resolva tudo sozinha. A corporação recebe toda carga de crítica da comunidade, que a culpa pela violência crescente.

Na verdade, o Policial Militar moderno recebe uma educação de primeiro mundo, de onde saem soldados com a qualificação de Carlos Eduardo, mas o problema da segurança pública continua: a falta de condições operacionais, a falta de apoio, a baixa remuneração e a forte influência política nessas corporações. O policial hoje assume as funções de enfermeiro, juiz de paz, conselheiro, agente de saúde e até psicólogo. A maior homenagem que se pode fazer ao herói Aspirante Carlos Eduardo, ao dedicado praça Messias Paulino e a todos os profissionais da segurança pública é apoiar a PEC 300, que nivela os salários dos policiais militares e bombeiros de todo o Brasil.

De nossa parte, vamos providenciar a medalha do nosso herói Carlos Eduardo, que é filho de Itabaiana, sobrinho do nosso estimado amigo Beto de Zé de Paulo. O vereador Zé Cobal, rápido no gatilho, já encaminhou à Câmara pedido de aprovação de Voto de Aplausos ao competente militar.

domingo, 4 de outubro de 2009

Fabio Mozart - SOCORRO COSTA, POETISA E JORNALISTA

A década de 1950 marcou o melhor período de desenvolvimento de Itabaiana. Possuidora da maior feira de gado do Estado e da “feira livre” mais concorrida e famosa da região, a Rainha do Vale do Paraíba ostentava, como acontecimento marcante, a Festa de Nossa Senhora da Conceição, sempre no período de 1 a 8 de dezembro, constando suntuosas solenidades litúrgicas e festividades profanas, sempre abrilhantadas pelas jovens da sociedade local que, divididas em dois partidos – Louras e Morenas, Rosas e Margaridas, etc – concorriam à preferência dos milhares de freqüentadores da Festa da Excelsa Padroeira, em palanque armado no pátio da Matriz.

A Banda Musical “1° de Maio”, sob a batuta de Zé da Justa e presidida pelo patriarca Daciano Alves de Lima, deleitava os circunstantes com a execução de dobras da lavra dos nossos mais famosos compositores e, sob os olhares perplexos dos apaixonados pela musica erudita, executava peças notáveis de Mozart e outros mestres da música clássica imortalizada.

Parques de diversões enchiam de alegria e emoção a meninada, com seus balanços, rodas gigantes, carrosséis, destacando-se o carrossel de Porcidônio, empurrado manualmente pelos robustos trabalhadores do ferreiro-empresário. Barracas de prendas, cachorro-quente, sorvete, pipocas, roletes e outras guloseimas completavam as atrações da festa.

De forma singular e toda especial, na festa da Padroeira, o destaque maior era o jornal “O Gafanhoto”, redigido, durante mais de uma década, pela sua fundadora Maria do Socorro Costa. O humorismo que difundia, a alegria que espalhava, a verve sadia e o entusiasmo contagiante do periódico de quatro páginas pontilhavam como ingredientes necessários e indispensáveis ao êxito da festa.

Ao lado dos conceitos de competência e bom gosto na criação de piadas de humor sadio, “O Gafanhoto” era, também, uma publicação endereçada aos jovens que faziam a sociedade itabaianense, contando, de forma engraçada, fatos da vida cotidiana, tendo como protagonistas os rapazes que se destacavam na convivência social, como Zuquinha, José e Luis Tavares, Onaldo Fonseca, Zé Batista, Luis Bodinho, Pedro Souto e outros cujos nomes seria enfadonho mencionar.

“O Gafanhoto” criou também a “Bagaceira”, local onde se armavam barracas destinadas à venda de bebidas e tira-gostos especiais, como caranguejo, camarão, caju, picado e galinha caipira. Não raro, ao apagar das luzes, o jornal citava como assíduos e cativos freqüentadores da “Bagaceira”, figuras importantes da cidade, como o Escrivão Zé Maria, seu colega Zé Bandeira, o mano Rivaldo, Nabor, Zé Bodinho e outros mais. A Bagaceira era o “remanso” da festa da Padroeira.

“O Gafanhoto” espalhava, sobretudo, a alegria que era uma forma de oração à Padroeira, apanágio da dignidade de um jornalzinho que fazia humorismo sem exprimir conceitos pejorativos contra ninguém. “O Gafanhoto” de Socorro Costa era assim: alegre e feliz como a vinda de Jesus; como na expressão do poeta: “o mundo de amanhã pertence aos que anunciam a alegria”. E Socorro Costa provou à sociedade que somente a alegria e o amor edificam a beleza do espírito.

Socorro Costa está entre as dezenas de mulheres, damas itabaianenses que, em épocas passadas e não muito remotas, serviram com inteligência e sabedoria, competência e determinação à Rainha do Vale, emprestando a sua cultura e os seus talentos aos interesses da comunidade.

Socorro Costa foi uma poetisa apaixonada, uma jornalista brilhante e vigorosa. Foi vereadora, tendo exercido, na gestão do Dr. Odon de Sá, a Tesouraria da Prefeitura.
Escritora fidalga, a ilustre confreira Socorro Costa recebe a nossa mais sincera homenagem. (Arnaud Costa)

FOTO: Socorro Costa (à direita) com o historiador Sabiniano Maria (centro) e o ex-prefeito Fernando Cabral de Melo.

sábado, 3 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Aprendiz de ditador ou mestre da mutreta?

Às sete e meia da “madrugada” de uma segunda feira, amigo meu telefona para pedir orientação sobre como proceder para participar de uma rádio comunitária instalada em sua cidadezinha. Conforme ele, a direção da tal emissora transformou-a em um reduto do seu grupo político e, o que é pior, impedindo que os cidadãos participem efetivamente da rádio. O exercício do direito de comunicação no âmbito das emissoras comunitárias deve assegurar que as comunidades não sejam somente receptoras, mas sobretudo que desempenhem a função de emissores, sendo agentes protagonistas de fato e direito nestes veículos instituídos com a finalidade de servirem aos interesses do município ou do bairro. Esse é o espírito da lei que criou o serviço, mas o reconhecimento desse direito é um problema nas pequenas comunidades do interior, onde um grupo se apodera da rádio comunitária e passa a operar com as mesmas características e finalidades das rádios comerciais, onde o único objetivo é a audiência e consequentemente o lucro, pois quanto maior a audiência mais credibilidade terá para o anunciante que mais investirá na emissora.

Esse questionamento vem dando pano para as mangas em conflitos que já estão sendo levados ao Ministério Público Federal. Acho que é uma falha de caráter do brasileiro, resquício de nossa colonização, esse ranço autoritário. Fatia mínima de poder na mão de um zé ruela qualquer já é suficiente para mostrar seu lado de déspota. Eu aconselhei ao camarada buscar seu direito na Justiça. O grande problema é a falta de informação das pessoas sobre os princípios e finalidades das rádios comunitárias, contribuindo para que oportunistas se apropriem destes espaços e deles façam uso em beneficio próprio, adotando práticas mais comuns às rádios comerciais, deixando em segundo plano o papel social que deveriam desempenhar. São emissoras comunitárias de fachada, que na grande maioria dos casos são propriedades de pequenos empresários ou grupos políticos e agremiações religiosas.

Nesse capítulo da astúcia e cinismo de alguns “donos” de rádios comunitárias, um se destaca pelo inusitado do seu regulamento. O camarada quer se perpetuar como presidente da rádio e botou lá no estatuto um artigo que diz que os casos omissos serão resolvidos exclusivamente pelo presidente, e uma dessas omissões é exatamente a eleição. O ditador confesso e assumido reina em uma cidadezinha da Paraíba. Ah!... se os homens de bem tivessem a imaginação dos canalhas!

FOTO:

Rádio de Salgado de São Félix. Na fachada, a palavra “comunitária” foi excluída. Vergonha de ser comunitária ou medo de perder o comando da emissora que deveria ser de gestão pública? (FOTO: FÁTIMA VIEIRA)

sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Fábio Mozart - Dedo na ferida e em outros locais sensíveis...

Meus ocasionais leitores são minha alegria! Gente fina de sul a norte, adeptos da Toca do Leão, pessoal inteligente credenciando esse blog.

Luciano Silva, de João Pessoa, enviou mensagem comentando crônica sobre médicos mercenários e preconceituosos: “Fábio, parabéns, você está colocando o dedo em uma ferida - e das grandes - quando fala do estado da profissão médica na Paraíba e no Brasil. Minha noiva é médica (das boas) e os casos relatados são assustadores. Juntando a experiência própria e dos familiares, chego à conclusão de que a profissão médica é hoje uma profissão esclerosada, carente de um diagnóstico preciso e de tratamento idem. Os médicos saídos das faculdades hoje são jovens estressados, preconceituosos, frustrados, deprimidos, desiludidos com o que julgavam ser uma profissão glamorosa. E não parecem ter as ferramentas intelectuais, conceituais ou emocionais para lidar com seus problemas racionalmente. Acabam descontando toda a raiva no paciente, que na maioria das vezes não tem como se defender. Continue relatando casos de abuso médico em seu blog. Com certeza prestará um grande serviço à Paraíba”.

Sobre a crônica “A imbecilidade ao alcance de todos”, falando de vereadores preocupados em fazer testes proctológicos para provar que não são homossexuais, Mari de São Paulo mandou dizer: “Haja dedo para tantos imbecis. Mas se for um toque gostoso... pode-se ter grandes revelações”. Jimi de Minas Gerais falando sobre o mesmo assunto: “Cada povo tem o representante que merece. Se a moda pega... Mas aqui no meu ninguém toca!”.

A croniqueta “PC do Boi” rendeu muitos comentários. Lemos do Rio de Janeiro escreveu: “Três vezes fera, Fábio Mozart! O tom de humor de sua crônica lembra-me épocas do PC aqui no Rio de Janeiro. As escadarias da PUC/RJ eram um nojo só. Fedia. Todos de calça jeans rasgada, tênis sujo, cabelos daquele jeito e debaixo do braço um uísque 12 anos. Que festa! Pena que não virou centopéia para o carnaval carioca. Um abraço de quem entende de Monitor Maçônico”.

O escritor Waldir Porfírio, autor do livro “Bandeiras Vermelhas”, citado na crônica, prestou esse testemunho: “Querido Fábio Mozart, antes de qualquer coisa, gostaria de agradecer a citação do meu livro como fonte de inspiração para o seu artigo PC do Boi. Quando comecei a reunir os documentos e entrevistar os veteranos comunistas, queria tirar do anonimato os heróis da luta do nosso povo.

Graças a eles gozamos hoje de direitos trabalhistas, como décimo-terceiro salário, jornada de trabalho e salário mínimo. No campo econômico e social, devemos aos comunistas de meados do século passado a estatização do nosso petróleo e o fim da semi-escravidão dos camponeses. Como era difícil fazer política naquela época de perseguição aos comunistas pelo Estado! As formas de comunicação entre as direções do partido e os militantes, e estes e as massas eram precaríssimas (o rádio estava nascendo, a TV em estágio embrionário e o telefone era um instrumento raro). Restavam aos comunistas os panfletos e jornais feitos na clandestinidade. A realidade hoje é outra.

As elites detêm os meios de comunicação de massa em suas mãos para levar ao povo apenas as informações que interessam a elas. Quem disse que privatizar é bom para o País? Quem está defendendo entregar o pré-sal ao setor privado? Quem está atacando a defesa da nossa soberania? Não deve ser fácil aos comunistas ou qualquer outra corrente ideológica fazer política com tamanha desvantagem. Ainda bem que a internet é um bom espaço democrático que ainda não foi privatizado e permite batermos esse papo. Obrigado”.

Fábio Mozart - Papa-cu, papa-figo e papangu

Um dia, em mesa da pensão de Nevinha Pobre, no cabaré de Itabaiana, estávamos tomando goró eu, Sanderli, Pedro Lourenço, Zenito Oliveira, Idalmo da Silva e Biu Penca Preta. O goró devidamente acompanhado por feijão verde com coentro e pedaços de carne de jabá. A conversa girava em torno de religião. Na época, todos éramos adeptos de um agnosticismo nebuloso. Hoje, meu compadre Sanderli professa a fé evangélica dos pentecostais.

O lero-lero nos levou às posições corajosas de D. José Maria Pires, arcebispo da Igreja Católica, na ocasião em plena guerra contra os meganhas da ditadura na frente de luta de Alagamar, conflito agrário ocorrido em Salgado de São Félix. Essa Igreja dos pobres e desvalidos tentando saldar a dívida social enorme, com sua opção preferencial pelos miseráveis e injustiçados do terceiro mundo, era nossa igreja. Mas a Igreja dos preconceitos e dogmas ultrapassados não merecia nosso respeito.

Lembro que Sanderli, estudioso de papas e suas safadezas, informou: “O Papa Estevam V afirmou com todas as letras que os papas, como Jesus, são concebidos por suas mães ao serem engravidadas pelo Espírito Santo. Todos os papas são uma espécie de homens deuses, com o propósito de serem mais capazes de servir de mediadores entre Deus e a humanidade. Todos os poderes do céu e da terra lhes serão concedidos”. Apesar de semideuses, os papas sempre gostaram de apoiar regimes como o nazismo e o fascismo.

A esperta Igreja ficou milionária, com a criação do IOR (Instituto per le Opere di Religione), o maior, mais fechado e mais secreto Banco do mundo, do qual o Papa é o único e exclusivo operador. Na verdade, um grande centro de “lavagem de dinheiro”. O Vaticano é o único estado do mundo que não tem cidadãos natos, desde que os sacerdotes e freiras são proibidos de procriar e jamais nasceu qualquer criança dentro daqueles 44 hectares. Estado teísta, machista e que, segundo os papas, pretende governar o mundo. Se Edir Macedo não chegar primeiro...

Sem muito interesse na conversa, Penca Preta encerrou o papo de papa:
--- Na minha família deu três papas: um papa-cu, um papa-figo e um papangu.